A obesidade é uma condição que constitui uma das mais graves epidemias do século XXI. Apesar de representar um dos principais problemas de saúde pública da atualidade, continua ainda a ser de difícil tratamento. Sobretudo por se tratar de uma doença crónica complexa, influenciada por fatores genéticos, ambientais, comportamentais e sociais.
De acordo com as estatísticas mais recentes, cerca de 60% da população adulta portuguesa e 30% das crianças têm pré-obesidade ou obesidade. Estima-se, ainda, um aumento da obesidade de 2,8% ao ano entre 2020 e 2035 para a população adulta e de 3,5% no caso das crianças, o que são dados alarmantes.
Apesar desta ser uma realidade altamente prevalente, importa reconhecer que existem disparidades socioeconómicas. A obesidade afeta mais as populações com menor rendimento, menor escolaridade e menor acesso a alimentos frescos ou a espaços para atividade física. Além disso, de forma mais transversal, fatores como o aumento do sedentarismo, a urbanização e a disponibilidade de alimentos pouco saudáveis contribuem para um ambiente obesogénico.
Portugal tem dado alguns passos importantes na resposta à obesidade. Por exemplo, a criação do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável e do Programa Nacional para a Atividade Física, a implementação de medidas fiscais como a taxa sobre as bebidas açucaradas, o reforço da regulação da publicidade alimentar dirigida a crianças e a introdução de rótulos nutricionais simplificados (semáforo nutricional) em alguns produtos.
No entanto, apesar destas iniciativas, a resposta continua fragmentada e insuficiente. O acesso a tratamentos eficazes, incluindo consultas multidisciplinares em obesidade, apoio psicológico, farmacoterapia e cirurgia bariátrica, é desigual e muitas vezes limitado a grandes centros urbanos. Muitos utentes não têm conhecimento sobre as opções terapêuticas disponíveis no Serviço Nacional de Saúde (SNS) ou, aqueles que têm, enfrentam listas de espera demoradas. Além disso, o estigma associado à obesidade permanece profundamente enraizado, inclusive entre profissionais de saúde, o que pode comprometer a qualidade do cuidado a estes utentes.
É preciso mudar a forma como Portugal encara a obesidade: não como uma falha individual, mas como uma condição médica que exige uma resposta sistémica, sustentada e centrada na pessoa. Isso implica:
- Expandir e qualificar as respostas no SNS com equipas multidisciplinares especializadas acessíveis em todo o país;
- Reforçar a formação dos profissionais de saúde para diminuir o estigma no tratamento da obesidade;
- Intensificar políticas públicas que promovam escolhas alimentares saudáveis, especialmente em zonas economicamente vulneráveis;
- Dar voz às pessoas com obesidade, envolvendo-as na construção de soluções.
Portugal tem a oportunidade de olhar para os números — mas sobretudo para as pessoas por trás deles — com empatia, rigor científico e compromisso político. Porque lutar contra a obesidade não é lutar contra corpos, é lutar por saúde!